segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Chapecoense, o clube que chegou literalmente ao topo

A trajetória de quem chegou ao ápice, protagonizou a maior tragédia do futebol e agora busca se reerguer
Criada em 1973, a partir da união de dois times da cidade de Chapecó (SC), a Associação Chapecoense de Futebol despontar no cenário regional desde seus primeiros, porém foi somente em 1977 que o time levantou seu primeiro troféu, o de campeão catarinense de futebol.  Após alguns anos sem conquistas, o time não deixou se abater, entre derrotas e vitórias, ressurgiu no final da década de 90, voltando a conquistar o campeonato estadual em 1996.
Outras façanhas só viriam onde anos depois. Nos 2000 o pequeno clube do interior passou a se intrometer no caminho grandes do futebol do Brasil. Um século XXI glorioso, mas que começou em 2000 com problemas financeiros que quase fizeram com que o clube fechasse às portas. Foram quase cinco anos de reestruturação, em 2005 o “Verdão do Oeste”, como é carinhosamente chamado, deu a volta por cima. Montou um bom elenco, trouxe nomes badalados, formou jogadores e sua categoria de base. O resultado veio, dois anos depois, em 2007 com mais um título catarinense.
Em 2008 o time fez um bom Brasileirão da Série D, mas acabou eliminado ainda nas primeiras fases. Um ano depois, em 2009, a primeira glória para o clube, foi nesse ano que o clube começou a crescer cada vez mais, o terceiro lugar garantiu o acesso a Série C de 2010.  No ano seguinte, outro troféu para a estante do clube, mais um título catarinense, coroando assim ainda mais a história da Chapecoense em 2011.
Na Série C foram três temporadas atuando, já em 2012 a história foi diferente, a Chapecoense conquistou mais um terceiro lugar na qual foi promovida para disputar a Série B do ano seguinte. E o verdão não gostou de jogar o Brasileirão da Série B, pois com o vice-campeonato de 2013, o time chegou pela primeira vez em sua história à elite do futebol nacional, a Série A do Campeonato Brasileiro. Na estreia do clube na primeira divisão, um discreto 15º lugar, ficando na beira de voltar a Série B. No ano seguinte, o clube catarinense subiu uma posição, ou seja, fechou o campeonato na 14ª colocação. Outra força do time, foi logo na primeira competição internacional de sua história, onde chegou a uma semifinal de Copa Sul-Americana, perdendo para o River Plate à vaga na final.
O torcedor iniciou 2016 empolgado ainda mais, pois o clube disputaria quatro competições na temporada e com o time que estava sendo montado daria esperanças de algo melhor até o fim do ano. Primeiro o estadual, e novamente o clube sagrou-se campeão. De lá para cá, o clube parou na primeira fase da Copa do Brasil, nada que tirasse o ânimo do elenco, que perderia seu treinador para o Bahia, Guto Ferreira. Chegou para o seu lugar, Caio Júnior, que deu um novo ânimo ao grupo, que com a chegada de alguns reforços rodados, os resultados apareceram, e todos se destacavam durante os jogos.
Na Copa Sul-Americana o clube vinha aos trancos e barrancos, após perder às partidas de ida, era no jogo de volta da Arena Condá, que o torcedor fazia um verdadeiro caldeirão, e à baixo de chuva o clube conquistava viradas históricas e assim ia avançando jogo após jogo. Nas semifinais, um gol tiraria o time da final inédita, dentro de casa contra outro argentino o San Lorenzo, o resultado teria que ser diferente de 2015. Desta vez o fator local fez valer, e o time empatou em 0 a 0, mas como havia empatado em 1 a 1 no jogo de ida, se classificou graças ao “gol qualificado” para a final.
Sem abdicar do Brasileirão, o time treinado por Caio Júnior sempre ia à campo com o que tinha de melhor. E os resultados mostravam isso, o 9ª lugar na competição nacional era um recorde para clube, pois nunca havia chegado nessa condição ao fim do campeonato, faltando uma rodada.
Quis o destino que no dia 29 de janeiro, ficará na história do futebol mundial, o time se preparava para a disputa das finais com o Atlético Nacional da Colômbia, quando o avião em que o time viajava caiu, e matou 48 membros da Chapecoense, entre dirigentes, comissão técnica e jogadores, além de jornalistas e membros da tripulação, totalizando 71 vítimas e apenas 6 sobreviventes (dois tripulantes, o jornalista catarinense Rafael Henzel e os jogadores Neto, Jackson Follman e Alan Ruschel).
           
Homenagens mundo à fora
A maior tragédia da história do esporte mundial rendeu homenagens pelo mundo inteiro, passaram-se mais de 15 dias do fatídico evento catastrófico e as mensagens de força e solidariedade a todos atingidos com o ocorrido seguem. Jogos importantes do cenário nacional foram adiados por uma semana, e o ponto máximo foi a congratulação da Chapecoense como campeã da Copa Sul-Americana 2016 – título oficializado pela Conmebol após abdicação do Atlético Nacional em disputar a decisão, que sendo, em meados do ano que vem, irá encontrar o Verdão do Oeste na final da Recopa. Pela internet, além de manifestação vinda de todos os lados, as hastags #ForçaChape e #SomosTodosChape foram as mais clicadas mundialmente nas redes sociais.
            Em Chapecó, enquanto a consternação pela tragédia ainda era total, onde muitos pareciam estar anestesiados não acreditando na notícia, a Arena Condá esteve lotada nas três noites seguintes tragédia: orações, homenagens e gritos de “vamo, vamo Chape”, este era o cenário. Na quarta-feira que ocorreria a decisão, a Colômbia deu seu maior show de solidariedade entre tantos atos feitos naquela semana. O estádio Atanasio Girardot, em Medelín, esteve completamente lotado para uma noite marcante em homenagem ao clube brasileiros.
            O grau de emoção das homenagens, não importando qual seja, era gigantesco, no entanto o dia mais arrepiante, da “ficha cair” estava por vir. Na sexta-feira, a Arena Condá deu um tempo as homenagens, o gramado que protagonizou belos lances estava sendo preparado para a consagração total de 50 campeões, que no sábado foram velados coletivamente abaixo de muita chuva. Quisera o destino que uma chuvarada caísse sobre Chapecó, parecia proposital para se juntar as lágrimas de todos que estiveram presentes no local. Os campeões que conquistaram título e vaga na chuva, foram vitimados numa catástrofe em meio a uma tempestade e, também, em algo aparentemente traçado pelo destino, foram velados e enterrados junto as aguas que caíam do céu.

Velório: Solidariedade e tristeza lado a lado
            O cenário da Arena Condá era impressionante. Se o dia a dia do jornalismo brasileiro e mundial tornou-se diferente após a tragédia, especialmente naquela semana, para nós essa dimensão era ainda maior, afinal estamos próximos, tão emanados neste projeto que cada vez mais conquistava as pessoas e a admiração dos grandes amantes do futebol. Foi uma loucura na redação, no coração. Ninguém, em sã consciência, foi capaz de segurar todas as lagrimas que tinha. Em meio a tudo isso a dificuldade de cobrir todo aquele cenário era confrontante, o foco foi indispensável, apesar de complicado de mantê-lo por momentos.
            A Arena Condá estava dividida em sentimentos, pois aquele momento apresentava beleza, solidariedade, era um instante de homenagem, mas não era só isso, pois, também, todos ali, por dentro, discutiam com o vento, denotavam um vazio sem tamanho – visível, apesar de toda multidão. Dava pra sentir tudo, o que se sentia era tristeza profunda: passos curtos, silêncio absoluto e uma insistente chuva fina que caía sobre o oeste catarinense.
            A comoção das arquibancadas era algo espantador, mas nada comparado ao vivenciado dentro do campo. Um cenário desigual ao corriqueiro. Ao invés de jornalistas à beira do gramado, familiares na social e jogadores nas quatro linhas, o que se via era uma rastro de guerra. Pessoas de vários lugares do mundo, imprensa de todos os continentes, todos aguardavam a chegada dos campeões da Sul-Americana. As pessoas até tentavam aplaudir de pé e vibrar com lembranças boas, porém a tristeza predominava. A tristeza ainda predomina. Aaaah, infinita tristeza.
            Num dos momentos de maior comoção, isto no espaço reservado aos jornalistas, Galvão Bueno, da rede Globo, interveio junto ao repórter Erick Faria e o sistema de som do estádio permitiu que o emblemático narrador levasse uma mensagem a todos ali presentes. Naquela altura todos já haviam chorado, mesmo que estivessem delegados para o desempenho profissional. Ficava cada vez mais difícil suportar um clima tão melancólico e doloroso.
            Quando chegaram os corpos no aeroporto, a comoção foi geral. Os jornalistas esqueceram um pouco do seu compromisso, os olhos voltaram-se ao telão. Um cenário emblemático, que só quem estava ali poderia descrever, embora seja complicado encontrar palavras para tal. Em meio a aplausos, choros, uma música leve e triste que tocava em caráter uniforme no estádio, as pessoas se abraçavam e não conseguiam ainda depositar a ficha sobre o ocorrido.
            Logo, após uma angustiante espera pela procissão que trazia os caixões à Arena Condá, o despertar veio ao olhar o portão 14: ERA VERDADE! Alguma coisa fazia com que o inconsistente negasse aquela realidade que a imprensa noticiava, no entanto era a própria imprensa que naquele instante procurava forças e energia para conseguir trabalhar. Os militares passaram a carregar os caixões, irônico a chuva apertar demasiadamente e de forma inexplicável no instante da chegada dos corpos. Parecia um sinal, talvez? Provavelmente sim – para os que creem. Pareceu uma lição divina, Deus se manifestava naquele ato. Ninguém na Arena – e, possivelmente, em qualquer lugar do mundo – tinha a prepotência de reclamar das condições climáticas extremamente desfavoráveis, pois nada mais fazia sentido perante a uma tragédia tão grande. De que vale o dinheiro, a ganância, a soberba, o orgulho, a fama? Num piscar de olhos, o local de tantas glórias, de gols do Bruno Rangel e defesas do implacável Danilo, tornava-se o abrigo dos que ali se despediam de 50 corpos, dentre os 71 que padeceram na queda da aeronave da LaMia.
            Ocorreram mais homenagens no gramado. Balões foram soltados, vítimas lembradas, autoridades se pronunciaram. Familiares choravam ao lado do caixão do ente querido, mas também se solidarizavam com os demais que ao lado sofriam com a mesma dor. Ocorreu a despedida. Chegou o momento do fim do velório coletivo. Muita coisa aconteceu na Arena naquele sábado, mas o clima não alterou, a chuva seguiu inapelável. Eram lagrimas. Assim a imprensa encerrou seu trabalho, mas não havia orgulho no semblante daqueles profissionais. Aquela cobertura gigantesca não trazia nenhum sentimento de alegria, ninguém gostaria de estar lá para presenciar o que não se pode contar apenas com palavras, envolve emoção, coração, somos humanos. Estivemos em Chapecó, na Arena Condá. Estivemos no inferno das lamentações, no céu da solidariedade.

A Chape após a comoção da tragédia
            Apesar dos pesares, mesmo que a tragédia ultrapassa os limites do esporte, a Associação Chapecoense de Futebol não acabou e, sendo assim, o futebol terá que continuar sendo pensado, preparado e praticado. Embora a espinha dorsal do clube tenha rachado, a vida tem que seguir. Aos poucos a direção vai sendo reestruturada e ganhando novos nomes, sendo liderada por aqueles que não viajaram a Medelín. Ivan Tozzo, então vice-presidente, assumiu a cadeira presidencial interinamente após a morte de Pallaoro.
A ideia é dar continuidade ao projeto, que ganhou um recomeço com o anúncio de Rui Costa como diretor executivo, além do dirigente João Carlos Maringá e o gerente Nivaldo Constante, ex-goleiro que se aposentou depois do acidente, antes de completar sua partida de número 300 pela Chape. Embora Tozzo seja o presidente interino, a tendência é que Plínio David do Nês, o Maninho, seja o mandatário para o biênio 2017-18, pois ele encabeça a chapa única da eleição presidencial, substituindo o então presidente Pallaoro – vítima na tragédia, juntamente com a grande maioria dos demais componente da chapa.
            Os atos de solidariedade não se resumiram à homenagens ao clube, sendo que inúmeros clubes se puseram a disposição para colaborar com empréstimo de jogadores. Outros propostas de movimentos também surgiram, uns já retirados de pautas e outros que seguem como possibilidades, nada além disso. Entretanto, a Chapecoense adota um discurso de “pés no chão” e paciência para reerguer o clube, porém com calma suficiente para não derrubar a eficaz fórmula de se fazer futebol de qualidade com recursos financeiros limitados. O roteiro ideal a ser seguido é esse, novamente o caminho certo está sendo tomado.
            A Chape já anunciou seu treinador: Vagner Mancini. Não se fala ainda em possíveis reforços, mesmo que alguns jogadores tenham sido oferecidos e até mesmo se oferecidos gratuitamente, caso do veterano argentino Román Riquelme. Outro nome é o de Ronaldinho Gaúcho, que chegou a ventilar esta possibilidade. Nomes de badalação renderia muito em marketing, provavelmente traria lucros na venda de camisetas e eventos publicitários, e sim, é momento de se pensar em dinheiro, pois sem boa condição financeira se manter no topo é impensável. O clube sofreu uma catástrofe, mas aos poucos a tragédia será cicatrizada, principalmente pelos adversários, pois a vida segue e ninguém irá perder por gosto a vida inteira por solidariedade. Por razões que é preciso avaliar como nunca antes foi feito, pois lamentavelmente alguns atos de bondade podem trazer prejuízos.
            Depois da tragédia, e devido a ela, a Chapecoense tornou-se um clube mundialmente conhecido. Principalmente em 2017, as atenções estarão voltadas ao time de Chapecó. A imprensa mundial acompanhará o Verdão do Oeste por toda a temporada, talvez ao longo de toda história futebolística nunca antes um clube brasileiro será tão acompanhado por tantas emissoras do mundo inteiro como ocorrerá desta vez. Nada impede que possa surgir “interesseiros” de má fé.
Definir toda direção, e aplicar a cartilha do sucesso. Acertar a renovação contratual com patrocinadores, bem como firmar novos vínculos com alto custo beneficio. Explorar a marca Chapecoense, aumentar ainda mais o quadro associativo do clube e atrair o interesse de investidores. Montar comissão técnica inteligente e que faça o perfil traçado pelo clube, bem como saiba trabalhar com as limitações do clube e aposte em trabalhos a longo prazo. Contratar atletas com a “cara” da Chapecoense, mas que não venham com a cobrança de substituírem os que partiram e muito menos superar os feitos dos mesmo como obrigação maior, mas que tentam fazem isso pelo dever de profissionais, bem como repudiar discurso de luto eterno refletido em campo, como forma de desculpa. Difícil acertar em todos esses aspectos, mas a cartilha é essa.
            A Chapecoense teve seu ápice futebolístico interrompido por uma tragédia, tornou-se mundialmente conhecido e terá que recomeçar, mas não do zero, já possui investidores, uma base, um exemplo próprio e competente a ser seguido. Tem a paciência e simpatia de todos simpatizantes do futebol mundial, tem carisma, basta manter a alma e a força de uma campeão. Apesar de boas expectativas, o futuro pode ser árduo. Se a ilusão tomar conta, com certeza será árduo. Para manter-se no centro das atenções do mundo inteiro não somente por conta de uma comoção, mas também pelos seus feitos dentro de campo, como estava acontecendo no futebol brasileiro, o clube catarinense terá que permanecer sendo o que sempre foi. A Chapecoense precisar ser Chapecoense, pois o próprio hino serve como exemplo e fonte de energia e apego, afinal, “nas alegrias e nas horas mais difíceis, meu furacão tu és um vencedor”

ED ANDREICK MOREIRA WISNIEWSKI
EDUARDO NERVIS KRAIS
LUCAS RODRIGUES
RENATO PADILHA

Material produzido para a disciplina de Jornalismo Esportivo,
pelos alunos do Curso de Jornalismo da UFSM/FW
Dezembro de 2016

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